domingo, 14 de junho de 2020

Conversando no fórum com Ana Paula, Adriana, Ursulina e Raquel sobre Educação como prática da liberdade.


A conversa foi boa e vale o registro, a memória.

[AE] A grande dificuldade que se nos põe e que exige um alto senso de responsabilidade está na preparação dos quadros de coordenadores. Não porque haja dificuldades no aprendizado puramente técnico de seu procedimento. A dificuldade está na criação mesma de uma nova atitude — e ao mesmo tempo tão velha — a do diálogo, que, no entanto, nos faltou no tipo de formação que tivemos e que analisamos no segundo capítulo deste estudo. Atitude dialogal à qual os coordenadores devem converter-se para que façam realmente educação e não “domesticação”. Exatamente porque, sendo o diálogo uma relação eu-tu, é necessariamente uma relação de dois sujeitos. Toda vez que se converta o “tu” desta relação em mero objeto, se terá pervertido o diálogo e já não se estará educando, mas deformando. Este esforço sério de capacitação deverá estar acompanhado permanentemente de um outro: o da supervisão, também dialogal, com que se evitam os perigos da tentação do antidiálogo.
Comentário:
A escolha deste parágrafo, que faz parte da 5ª fase de elaboração e de execução prática do Método, foi motivada pela posição estratégica que a formação de professores assume no contexto da metodologia, especialmente em função das palavras escolhidas para definir a tarefa: alto senso de responsabilidade; nova atitude; converter-se ; deformação; antidiálogo.
Ainda que Freire tenha substituído a expressão "formação de professores" por "preparação dos quadros de coordenadores" para escapar das marcas das práticas unidirecionais comuns à docência, mas a favor de um método ativo, dialogal, participante; ele deixa evidenciada a centralidade do tipo de postura necessária a quem se decide por esta profissão - atitude dialogal.

FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015.


[AP]Olá Ana

De fato, Freire o tempo todo em suas produções nos convida a refletir nossa condição, nessa relação comum unidirecional. Ele nos leva a perceber, nessa relação de diálogo em que o próprio texto é tecido, tamanha é a nossa responsabilidade nessa relação que se quer, horizontal. Somos convidados, a num ato de humildade cotidiano, perceber no outro seu potencial e dar protagonismo a ele. Isso é emancipar. Nessa direção, nos coloca na condição de sujeitos com, e não mais para, outros sujeitos. Ele nos chama à liberdade de perceber nosso contexto e em, percebendo-o, passamos à condição de sujeitos para sua transformação. E a partir dessa percepção, dá-nos a compreensão da dimensão do nosso potencial (e responsabilidade) em, por meio de nossa ação educativa, mediar a liberdade com outros sujeitos, nessa relação dialogal.


[AE] A dificuldade está na criação mesma dessa atitude dialogal em relação ao cotidiano da escola e da sala de aula, na qual a condição de "sujeitos com outros sujeitos" seja uma perspectiva compartilhada. Uma vez que as dificuldades inerentes ao aprendizado puramente técnico e de procedimento não seria o grande obstáculo.
Contudo, acrescento mais uma dificuldade, que não seria obstáculo.
Como criar uma nova atitude sem vivenciar as novas atitudes(dialogais) requeridas à docência?
Penso que criar as condições para que o diálogo se estabeleça consiste em um pré-requisito à substituição das práticas unidirecionais. Trata-se de criar as condições e de vivenciar metodologias que promovam o diálogo em sala de aula e na escola como um todo. Formação de professores sem esta dimensão fica "verborrágica", nas palavras de Feire. Tal como disse a Adriana, aqui e um pouco mais embaixo: "Estamos pregando Freire, Zabala, Piaget, Vygotsky... e estamos assumindo uma postura tradicional, unilateral e com discurso imposto." Interessante o verbo que ela escolheu: "pregando"!
Sem a vivência de formas dialogais de organizar o trabalho pedagógico na formação de professores, quando e como os docentes irão promover a atitude dialogal? Sozinho? Em sua sala de aula?
Acho que sim.
Se a escola possuir uma cultura democrática, se a escola possuir espaços e tempos para que o diálogo ocorra, tal como um projeto político pedagógico construído coletivamente e com bases dialogais, sorte para esse docente, que irá vivenciar os referenciais freireanos na formação continuada e em serviço.
Do contrário, mais repetição, pregação, fragmentação, práticas unidirecionais, antidiálogo e deformação.
Como disse, trata-se de mais uma dificuldade, mas não um obstáculo. As formações de professores se valorizam e se referenciam em Freire podem e devem cuidar de criar as condições e de vivenciar metodologias que promovam o diálogo.

[AP] Boa tarde Ana

Concordo plenamente. Fomos forjados numa cultura de práticas antidialogais, unilaterais, tradicionais e via discurso imposto. Passamos e ainda estamos passando por processos de transição e não é fácil abandonar a zona de conforto. Até porque, para nos colocarmos na posição de diálogo é preciso estabelecer a relação horizontal de que tanto Paulo Freire fala. E quase sempre estamos querendo nos colocar numa posição de superioridade. Tantos egos envolvidos...Tanta dificuldade de nos reconhecermos frágeis e ainda, aprendizes, ante aos nossos alunos. Quanto medo ainda existe do conflito. Precisamos ler muito ainda, Freire e outros autores, para perceber que nosso potencial está em reconhecer potencial nos outros e junto com eles nos fortalecer. Há tanto a aprender... Estamos em processo!

[AD] Oi, Ana! Sabe, Esse livro, assim como os demais de Freire, mais uma vez nos chama atenção para a postura dialogal tanto no processo quanto no planejamento. E isso me causa mais frustrações em relação ao meu produto educacional. Não me conformo de a gente elaborar uma proposta de trabalho pedagógico, sem dialogar com os diretametne envolvidos. Ainda que possamos redesenhar várias coisas em nossos projetos ao longo da implementação, não vejo tempo hábil para fazer mudanças significativas, nem lógica, diante de tudo que estudamos, essa decisão, sem o conhecimento da realidade e participação dos envolvidos. Estamos pregando Freire, Zabala, Piaget, Vygotsky... e estamos assumindo uma postura tradicional, unilateral e com discurso imposto. Espero que haja uma forma do Mestrado rever isso. Abraço!

[UR] Concordo com você Adriana.
Os modelos formativos que temos no geral se contradizem, ainda estamos engessados em sistemas, prazos limitados, regras que limitam e o nosso mestrado por estar dentro desse sistema segue estas regras que nos impõe uma prática de pesquisa e planejamento que pouco nos permitem o conhecimento dos sujeitos com quem trabalharemos, das suas reais necessidades, sonhos e desejos, menos ainda de considerar tudo isso na construção de nossos produtos. E agora, com a pandemia, as distâncias aumentam, os poucos contatos que poderíamos ter serão virtuais.
Abraço!

[AE] De fato, Adriana, algumas tomadas de posturas, algumas decisões requerem tempo. Um círculo de cultura freireano requer tempo. Tempo para o diálogo. A opção pelos referenciais teórico-práticos freireanos significa assumir um conjunto de práticas pedagógicas, de saberes fazer, de fazeres saber, em que o tempo é um fator estruturante.
A participação dos envolvidos, como você ressaltou, é outro fator fundamental para o alcance da implicação dos mesmos em seu projeto. 
Abraços!

[AD] Então, Ana! E aí fica a pergunta, ante a necessidade de tempo, como conduzir da melhor maneira nossas propostas pedagógicas para o ensino no mestrado, se não temos tempo suficiente? E digo mais, se é difícil aplicar o que estamos estudando e acreditamos no mestrado que tem a intenção de formar em nós tal postura, imagina o quanto é difícil você promover isso no dia a dia da escola, com todas as resistências e falta de estrutura. Acredito que já repensamos nossas posturas! Agora é pôr em prática- o que é muito difícil, mas não impossível. Mas confesso que muito me entristece o mestrado - que propõe abrir a nossa cabeça, aliar teoria e prática, promover a aproximação educação formal, contexto/ e interesse do educando,- se apresentar tão engessado como tenho sentido.

[UR] Olá Ana!

Este parágrafo também teve para mim um grande significado. Desde o princípio da minha formação e atuação profissional, as questões referentes a formação de professores me inquietam, vejo no cotidiano das escolas como os professores tendem a repetir na docência as experiências que viveram como alunos. E ainda vivemos nas instituições de ensino básico mas também nas de ensino superior, a formação de pessoas e profissionais sendo feitas nos moldes da educação que Freire chama de bancária. E como é difícil até para nós, que estamos aqui debatendo essa nova postura, esse novo comportamento, do diálogo, da participação, da emancipação, de uma educação libertadora, agirmos coerentemente com o que pregamos e nos constituirmos como o "exemplo que arrasta" e que pode efetivamente corporificar uma educação libertadora. Como disse a Adriana, neste fórum, precisamos nos vigiar constantemente.

[RA] Ana Elizabeth, também escolhi este parágrafo. Este é um grande desafio de formação docente, uma educação dialógica, e não bancária ou com efeito de dominação sobre o aluno.

[AE] Oi, Ursulina! Oi, Raquel!
A formação de professores é central para qualquer proposta pedagógica. A formação de professores, seja inicial ou continuada, é estratégica a qualquer mudança no campo educacional, seja no âmbito do projeto político-pedagógico quanto em uma rede de ensino. Então como estamos realçando os termos de uma postura, de uma disposição introjetada, de um habitus docente, concordamos que não pode nem deve ser discursiva, verborrágica; ela pode ser pensada nos termos de práxis, em prática pensada, em prática consciente.
Daí, ressalto que o diálogo não pode ser circunscrito à apenas uma prescrição, uma indicação, uma defesa de sua importância, mas deve ser vivenciado no cotidiano como um valor - em uma formação inicial ou continuada.
Penso que sem a dimensão prática, do saber fazer, do fazer saber, não avançamos à essa postura dialogal que deve sustentar a educação como prática de liberdade. E, que parece que concordamos, tão rara em nossas escolas.

[RA] Ana Elizabeth, concordo com profundidade sobre a formação de professores é uma questão de relevância. O diálogo que opera na escola alcança proporção e dimensões diferenciadas, apesar de ser horizontalizado. Localizar o diálogo na sua dimensão formativa, política, pedagógica. Assim a escola precisa ser dialogal, desde a recepcionista, como agente educador que está imbuída no ceio escolar, até o diretor em sua dimesão de gestão e política.

Cada espaço de diálogo tem dimensões diferentes de alcance que estão carregando conteúdos de formação do aluno.

Achei salutar você diferenciar um diálogo de apenas prescrição de um diálogo da prática do dia a dia. Particularmente, tenho dificuldade de enxergar o diálogo na sua práxix, pois ele está inserido num mundo de ideologias e posicionamentos. Diálogo a partir do meu pensamento e das minhas idéias. Que pressupostos de dialogos vamos construir? Apenas da escuta atenta ou de um diálogo propositivo e inteventivo. Desculpem se estou um pouco descrente, vejo muito no campo filosófico, ainda estou com dificuldade de visualizar este diálogo no campo da prática.

[AE] Exatamente, Raquel!
Enfatizo que importa a forma como o processo é organizado.
Se valorizamos o diálogo, precisamos cuidar de possibilitar a livre manifestação e a convergência de ideias a respeito das questões propostas, em sala de aula ou na escola.
Para a organização de processos participativos são requeridos também recursos técnicos específicos. Trata-se de saberes práticos que possibilitam as interações participativas, tais como: a organização do ambiente, o desenho da metodologia e a preparação para a mediação de processos dialógicos de qualidade. Ou seja, há saberes técnicos, saberes específicos para desenho e desenvolvimento de processos participativos que precisam ser observados para o estabelecimento do diálogo na escola e na sala de aula.
No fundo, nos reencontramos com a gestão democrática da educação, não é mesmo?



sábado, 13 de junho de 2020

Senta que lá vem uma História!




Leitura do prefácio de “História e Memória”, de Jacques Le Goff
https://www.youtube.com/watch?v=oroCFBbVFIM&feature=youtu.be

1. Que relações existem entre a história vivida, a história "natural", senão "objetiva", das sociedades humanas, e o esforço científico para descrever, pensar e explicar esta evolução, a ciência histórica?

História é também uma prática social (Certeau). 

2. Que relações tem a história com o tempo, com a duração, tanto com o tempo "natural' e cíclico do clima e das estações quanto com o tempo vivido e naturalmente registrado dos indivíduos e das sociedades?


Matéria fundamental da história é o tempo.

O calendário revela o esforço realizado  pelas sociedades humanas para domesticar o tempo natural.


3. A dialética da história parece resumir-se numa oposição – ou num diálogo –
passado/presente (e/ou presente/passado). 
4. A história é incapaz de prever e de predizer o futuro.

A oposição passado/presente é essencial na aquisição da consciência do tempo
Para a criança, "compreender o tempo significa libertar-se do presente" (Piaget).
A visão de um mesmo passado muda segundo as épocas.
O passado é atingido a partir do presente (método regressivo de Bloch).

5. Em contato com outras ciências sociais, o historiador tende hoje a distinguir
diferentes durações históricas.

A história seria feita segundo ritmos diferentes e a tarefa do historiador seria, primordialmente, reconhecer tais ritmos. Em vez do estrato superficial, o tempo rápido dos eventos, mais importante seria o nível mais profundo das realidades que mudam devagar (geografia, cultura material, mentalidades: em linhas gerais, as estruturas) – trata-se do nível das "longas durações" (Braudel).

6. A ideia da história como história do homem foi substituída pela ideia da
história como história dos homens em sociedade.

Se a história tornou-se, portanto, um elemento essencial da necessidade de identidade individual e coletiva, logo agora a ciência histórica sofre uma crise (de crescimento?): no diálogo com as outras ciências sociais, no alargamento considerável de seus problemas, métodos, objetos, ela pergunta se não começa a perder-se.

...

Conferência "Memória, História, Esquecimento", de Paul Ricoeur

Sobre os conceitos de Memória, História e Esquecimento em Paul Ricoeur

As questões em jogo dizem respeito à memória, já não como simples matriz da história, mas como reapropriação do passado histórico por uma memória que a história instruiu) e muitas vezes feriu.

A memória pode aparecer duas vezes ao longo da nossa análise: antes de mais, como matriz da história, se nos colocarmos no ponto de vista da escrita da história, depois como canal da reapropriação do passado histórico tal como nos é narrado pelos relatos históricos.

 Transmite também à reapropriação do passado histórico pela memória uma vez que o reconhecimento continua um privilégio da memória, do qual a história está desprovida
A história pode, no máximo, fornecer construções que ela declara serem reconstruções. 

Mas entre as reconstruções, tão precisas e próximas dos factos quanto possível, e o reconhecimento, subsiste um fosso lógico e fenomenológico.

Modo de apropriação do passado pela memória, constitui o contraponto de toda a operação historiográfica. É na possibilidade e pretensão de reduzir a memória a um simples objeto da história entre outros fenômenos culturais que se diferenciam muito claramente as duas abordagens. Essa redução é um dos efeitos mais surpreendentes da inversão dos papéis gerada pela emergência e desenvolvimento da história como ciência humana.

3 grandes fenômenos essa incursão no trabalho da historiografia: 
testemunho; compreensão; interpretação.

Da memória como matriz da história passámos à memória como objeto da história.

O caráter seletivo da memória, auxiliado nesse aspeto pelas narrativas, implica que os mesmos acontecimentos não sejam memorizados da mesma forma em períodos diferentes.

Os historiadores não devem esquecer que são os cidadãos que fazem realmente a história – os historiadores apenas a dizem; mas eles são também cidadãos responsáveis pelo que dizem, sobretudo quando o seu trabalho toca nas memórias feridas. A memória não foi apenas instruída mas igualmente ferida pela história.

O lugar do esquecimento no campo que é comum à memória e à história deriva da evocação que acaba de ser feita do dever de memória: este pode ser igualmente expresso como um dever de não esquecer.

Semana de Avaliação Glocal


Semana de Avaliação gLOCAL 2020
Centers for Learning on Evaluation and Results






Apresentamos na gLOCAL Evaluation Week 2020 - evento mundial dedicado a "promover elaboração de políticas baseadas em evidências e incrementar resultados em desenvolvimento".

Partipamos, eu e meus colegas pesquisadores da linha EPT, com o tema "Avanços e Desafios na Avaliação da Educação Profissional e Tecnológica (EPT)". 

Quem quiser assistir, e para facilitar, vocês podem acessar diretamente pelo Youtube, no Canal da Educação Profissional, cujo endereço está na postagem anterior.

https://www.youtube.com/channel/UCFAaX_xT-j8UjlE8L9J92hQ